Filmes como Soul e O Som do Silêncio, além de compartilharem uma premissa semelhante, abordam esse tema. Joe Gardner está tão obstinado na busca pelo seu sonho que acaba não percebendo o quão idealizado é, e o quanto tal idealização afeta seu jeito de ser - e esquece de contemplar os pequenos momentos da vida. Ruben Stone também, busca tão incessantemente recriar o passado que não se dá conta da atual situação de sua vida, e que precisa seguir em frente - e acaba aprendendo a contemplar a vida como ela é, da maneira que é possível.
Tivemos vários ótimos indicados esse ano no Oscar, desde filmes de época (Mank) a tramas políticas (Os 7 de Chicago), passando por temas sociais importantes (Judas e o Messias Negro, A Voz Suprema do Blues e Uma Noite em Miami) e filmes intimistas à lá Roma (Minari), entre outros. Foi a primeira indicação a um ator muçulmano (Riz Ahmed) e coreano (Steven Yeun) na categoria de Melhor Ator, e a primeira mulher asiática (Chloé Zhao) indicada a Melhor Direção - provavelmente irá ganhar, dado os diversos prêmios que está conquistando. Regina King fez falta, e Thomas Vinterberg surpreendentemente foi indicado.
Mas nenhum filme mexeu tanto comigo como Nomadland.
Pode-se comentar da direção precisa e marcante de Chloé Zhao, da grande atuação de Frances McDormand, da fotografia com planos gerais de encantar os olhos, da trilha sonora pontual e tocante... assim como poderia ser feita uma análise de como o roteiro trabalha o nomadismo como alegoria à "estrada da vida", de maneira extremamente simbólica e poética. Tudo isso, ainda, é intensificado pelo realismo quase documental da produção, que mescla atores e não atores. Mas o cinema é experiência, em especial filmes como esse, e se prender à tecnicidade nem sempre é bom. O enredo é simples e extremamente tangível: são pessoas que vivem suas vidas de uma certa maneira, passam por dificuldades e aproveitam os pequenos momentos. E isso é o suficiente.
Em tempos de um fluxo intenso de informação, poder parar e respirar um pouco, contemplar a vida, é algo muito bom. Estamos em isolamento social, mas assim como Fern, também estamos em constante movimento - aulas EAD, videochamadas, notícias, testes da internet, redes sociais.... Ou ao menos é isso que esperam de nós. Há uma cobrança excessiva em ser produtivo, estar sempre online, que nos pressiona a termos (ou a tentarmos ter) uma rotina cheia de atividades, quase como uma maneira de fugir de tudo que está acontecendo. Quem nunca pensou em jogar tudo aos ares, pegar um carro e sair por aí sem destino? Em um contexto sem pandemia evidentemente.
É um tanto quanto clichê, mas viver é estar em movimento. Estar atento ao que acontece no mundo é essencial, mas não temos como prever o que vai acontecer amanhã; precisamos nos cuidar e lidar com as surpresas da vida, e sentir é parte importante disso. Desde vibrar de alegria (ou o mais próximo disso) a se permitir sentir triste, tudo faz parte do trajeto. Valorizar os pequenos momentos, as pequenas conquistas; aproveitar a viagem, mesmo sem saber quando irá acabar.
Nomadland foi o primeiro filme em anos que desestabilizou meu lado racional e perguntou: e você, o que está fazendo da vida? Fiquei sem palavras. Qual rota estamos seguindo? O que estamos fazendo, por nós e pelos outros? Um dia (sabe se lá quando, esperamos que o quanto antes) a pandemia irá acabar, e o que iremos fazer? Será o mesmo trajeto? A única certeza que temos é que tudo acaba um dia. E é como dizem:
See you down the road.
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lucasnoronha99 (https://bit.ly/3dbE2p5)
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