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Aves de Rapina: Arlequina e Sua Emancipação Fantabulosa (2020) - O anti-heroísmo em cena

Um dos gêneros que vêm ganhando bastante destaque nos últimos anos é o de super-heróis. Há inclusive uma rixa simbólica entre as duas maiores editoras de quadrinhos, a Marvel e a DC, duas empresas gigantes que cada vez mais se consolidam também no meio audiovisual - cada qual com seu processo. Por muito tempo fui marvete - termo usado para chamar fãs da Marvel - mas com o tempo deixei isso de lado, já que ambas têm suas qualidades e defeitos. Desde Os Vingadores, a Marvel chama a atenção com sua construção de universo, aspecto que a DC deixou bastante a desejar, especialmente na fase Zack Snyder, culminando no fracasso retumbante chamado Liga da Justiça. Mas percebo que, após o término da Saga do Infinito, a Marvel está perdendo grande parte da força de suas últimas produções. É a deixa para a DC crescer. Nesse cenário, após mudanças no fluxo narrativo proposto pela Warner Bros., fomos surpreendidos por filmes como Aquaman (que particularmente não gostei tanto, mas foi um filme bem recebido de modo geral), Shazam! e o estrondoso Coringa, que ousou ao optar por seguir por um caminho bastante diferente das demais produções. O resultado está em todas premiações às quais o filme foi indicado, e nas incontáveis vitórias, incluindo o merecidíssimo Oscar de Melhor Ator para Joaquin Phoenix.

Mas chega de falar do Coringa. É hora de falar da clássica companheira dele, que foi o destaque em Esquadrão Suicida (ou a única coisa boa do filme talvez), e que agora ganhou um filme solo. Ou talvez não.

Aves de Rapina: Arlequina e Sua Emancipação Fantabulosa (2020)


Aves de Rapina, mais conhecido como o "filme da Arlequina", conta a história de um grupo improvável de mulheres que se juntam para combater um chefe da máfia impiedoso, Roman Sionis, mais conhecido como Máscara Negra. A líder é a companheira do Coringa, Arlequina, que após romper com este busca sua independência. Mas ela não é a única. Por causa do roubo de uma joia preciosa, ela acaba conhecendo Canário Negro (uma cantora da boate de Sionis), Caçadora (uma jovem justiceira implacável), Renee Montoya (uma policial que abriu um caso contra Sionis) e Cassandra Cain (uma ladra mirim que está sendo perseguida por Sionis). Assim como Arlequina, todas buscam por sua emancipação, e se juntam então contra seu inimigo em comum.

Após a decepção de Esquadrão Suicida, muitos ficaram um pouco receosos quando o trailer de Aves de Rapina saiu. Posso concordar em parte. Mas achei um filme bem interessante, para o que se propõe. Fiquei bastante surpreso, e além da Margot Robbie (que já roubou a cena na produção anterior), gostei muito da Mary Elizabeth Winstead como Caçadora, a segunda personagem mais desenvolvida, e que na minha opinião é a mais carismática de todas. As demais personagens - com excessão de Cassandra, que tem um arco bem interessante - não foram tão bem trabalhadas. A Canário Negro é uma das super-heroínas mais conhecidas da DC, e apesar de ter seu lado humano trabalhado, senti falta de ver ela em ação, usando seus super-poderes. E Renee Montoya ficou muito aquém das demais. Mesmo que ela seja "apenas" uma policial, poderia ser melhor desenvolvida.

Em busca de emancipação. (Crédito: Divulgação - Warner Bros.)

(ALERTA SPOILERS)

O tom do filme oscila bastante no início, ganhando força na segunda metade. O primeiro ato é bastante ousado estruturalmente, optando por uma narrativa não-linear, que de modo geral funciona bem (apesar de causar certa confusão de vez em quando). A introdução animada cai muito bem. Um aspecto que não funciona tão bem é o diálogo com o espectador, bastante inspirado em Deadpool, e achei a trilha sonora outro ponto negativo. As cenas de luta, apesar das eventuais câmeras lentas, são bem coreografadas e envolventes, especialmente a batalha final entre as Aves de Rapina e os capangas do Máscara Negra.

O vilão é um dos melhores até agora dos filmes pertencentes ao DCEU (DC Extended Universe). Ewan McGregor está ótimo como sempre, e sua química com o Victor Zsasz de Chris Messina é ótima. Isso me remete ao ponto que mais gostei em Aves de Rapina: a caracterização de heróis e vilões. Um dos pontos principais que Esquadrão Suicida pecou foi em forçar super-vilões a serem super-heróis. Por mais que a Arlequina ajude a "salvar o mundo" aqui, ela continua sendo quem é - uma ladra assassina. Cassandra Cain também. Da mesma maneira, Canário Negro, Caçadora e Renée Montoya, que nos quadrinhos são "super-heroínas", não têm suas naturezas alteradas. Cada uma segue seu caminho, sem ressentimentos.

Uma versão moderna e aterradora do clássico vilão do Batman. (Crédito: Divulgação - Warner Bros.)

Vivemos na era de anti-heróis no cinema, e Aves de Rapina, mesmo que longe de ser perfeito, é bastante satisfatório como retrato de anti-heroísmo. Uma ótima surpresa, e talvez uma das melhores apostas da DC Comics na sétima arte.

NOTA: 7 / 10

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