(Crédito: Divulgação - The Walt Disney Studios / 20th Century Studios)
(Contém spoilers)
X-Men é uma das equipes mais conhecidas de super-heróis dos quadrinhos, e uma das mais complexas. Por trás das aventuras da superequipe, há um comentário social muito forte - não à toa as personalidades de Charles Xavier e Magneto foram criadas espelhando, respectivamente, Martin Luther King Jr. e Malcom X. Além disso, suas histórias dialogam com temas como visibilidade LGBTQ+; alguns diálogos deixam isso bem claro, como veremos mais adiante. Mesmo com sua popularidade nas HQs, uma mídia que auxiliou muito nesse processo foi o cinema - mais precisamente o filme X-Men, de 2000. Bem antes do MCU, a Marvel até então não contava com muitas produções cinematográficas. Nesse contexto, Blade foi um grande sucesso comercial na época, abrindo as portas para a empresa na sétima arte, e X-Men confirmou isso.
O resto é história. O sucesso do longa acabou gerando uma franquia bastante cultuada que foi de altos e baixos, tendo lançado seu último exemplar esse ano, Novos Mutantes (que fiz uma crítica aqui no blog). Entre spin-offs que deram errado, um reboot, viagens no tempo e filmes R-rated, a trilogia original é um dos pontos mais altos da franquia. Vamos voltar para os anos 2000, quando a 20th Century Studios ainda ainda era Fox e não havia MCU.
(Crédito: Divulgação - The Walt Disney Studios / 20th Century Studios)
X-Men: O Filme começa na Segunda Guerra Mundial, onde vemos um fragmento do passado de Magneto e a primeira manifestação de seus poderes. Voltando para o presente, Marie está com o namorado, mas ao beija-lo quase o mata, para seu desespero e de seus pais. Em seguida, Jean Grey palestra em um congresso contra o Ato de Registo de Mutantes, e não é levada a sério. Na mesma sala está Charles Xavier, telepata e professor do Instituto Xavier para Jovens Superdotados. Ele reconhece Magneto, que rapidamente sai, e os dois se confrontam na saída. Um pouco depois, Marie foge de casa e, ao acaso, conhece em um bar um mutante selvagem chamado Wolverine. Após alguns atritos, Wolverine sai irritado do lugar, e Marie o segue. Ele acaba, a contragosto, dando carona a ela, e assim Wolverine conhece Vampira.
Só no começo já compreendemos as regras desse universo, quem são os personagens e como se relacionam. X-Men funciona muito bem como filme de origem, introduzindo de forma dinâmica, e um pouco didática às vezes, a dualidade Xavier-Magneto, a relação paternal de Wolverine com Vampira e as relações internas da equipe que serão exploradas futuramente, tal qual o sentimento de Wolverine por Jean e seu desdém por Cíclope. Aliás, sim, Wolverine é o protagonista da história. É um filme sobre uma equipe, mas o roteiro o põe, desde o primeiro filme, como o personagem principal. Isso fica evidente na abordagem de seu passado, que inclusive é parte importante do clímax de X-Men 2 - com o passar do tempo esse destaque acabou se tornando repetitivo, mas no início funciona bem. O grande mérito de X-Men, entretanto, é a maneira que o filme aborda as temáticas sociais e políticas tão presentes nos quadrinhos, sem deixar de lado a ação. Isso foi um diferencial, que o tornou atrativo para diversos públicos, desde os consumidores ávidos de HQs a um público mais alternativo.
(Crédito: Divulgação - The Walt Disney Studios / 20th Century Studios)
Em X-Men 2, talvez o melhor da franquia, isso fica mais evidente. X2 é facilmente um dos melhores filmes de super-heróis de todos os tempos. Consegue amplificar tanto a ação quanto o drama, e adiciona camadas bastante sombrias, mesmo com a censura PG-13. O passado de Stryker que o diga. O forte do filme, mesmo assim, é a caracterização dos personagens. O Wolverine sempre foi o centro da franquia, mas em X2 a Mística possui uma função narrativa incrível, e Rebecca Romijn brilha no papel (muito mais que a Jennifer Lawrence). Descobrimos sua motivação para estar no lado que está nessa guerra, e é uma motivação muito plausível, que reforça a discussão de "bem" e "mal". São todos mutantes, discriminados da sociedade, e é interessante os ver agindo em prol de uma causa maior - um vilão humano - sem deixarem de ser quem são (a reviravolta de Magneto é o melhor exemplo). Assim os conhecemos melhor, e o filme acerta em cheio na relação dos personagens e na construção de ritmo da história.
Mesmo personagens que acabam ficando de lado, como o Noturno (seria ótimo ver mais dele), trazem camadas e vieses diversificados que agregam muito - a construção da fé de Noturno, a impulsividade de Pyro contra a calma de Bobby, o diálogo deste com seus pais ("você já tentou não ser mutante?" é uma das falas mais fortes do filme)... são esses momentos que fazem X2 o ponto mais alto da franquia. Sem contar o arco de personagem do Wolverine. Seu contraponto com Stryker é muito bem abordado na história; a autodescoberta de Logan, até o ponto que este decide assumir seu nome e deixar o passado ir.
E claro, o final é muito interessante em vários aspectos. Uma das características principais do gênero de super-heróis são as cenas de ação e, quando baseado em quadrinhos, a fidelidade (ou não). Inserir sutilmente o arco da Fênix Negra já em X2, e matar a personagem da Jean no final do filme, trouxe um peso emocional imenso para a história e mostrou que heróis também morrem. De certa maneira, ela também foi movida pela sua fé, que além de fazer parte do passado de Noturno, é a visão de mundo de Xavier - a fé, a esperança de uma harmonia entre humanos e mutantes. E X-Men 2 tem uma das melhores cenas de abertura da franquia, além de trazer o tema clássico que, junto da música de abertura do desenho dos anos 90, é uma das marcas dos X-Men no audiovisual. Em linhas gerais, X2 é o filme que melhor traduz a essência dos X-Men.
(Crédito: Divulgação - The Walt Disney Studios / 20th Century Studios)
O mesmo não pode ser dito do capítulo final. Antes de tudo, X-Men: O Confronto Final é um filme especial para mim pois fez parte da minha infância, então tenho duas opiniões distintas. Nesse momento, é importante mencionar que... bem, o Bryan Singer definitivamente é uma pessoa problemática (não vou entrar nesse assunto, basta uma pesquisa no Google para compreender o por que disso), e em razão disso e de compromissos de agenda, foi necessária a troca de diretor. Quem pegou o posto foi Brett Ratner (outro diretor problemático), que não compreendeu essa essência, e fez um filme que... vamos por partes.
X-Men: O Confronto Final é um filme com sérios problemas estruturais. Há duas histórias paralelas, a da Fênix Negra e a da cura. Enquanto a da Fênix vinha sendo construída há um tempo, a da cura chega e não é nem bem desenvolvida. Fica evidente na construção do Anjo, um dos integrantes mais famosos da equipe que, aqui, não tem função narrativa nenhuma - ele serve como a motivação da cura, e então passa o resto do filme literalmente voando, sem interagir com nenhum outro personagem a mais, a não ser servir como o gancho de esperança que surge convenientemente quando a história pede. Literalmente um deus-ex-machina (ba dum tss). O excesso de personagens é outro problema sério; são muitos mutantes novos, que acabam não sendo desenvolvidos devidamente.
Outro problema está na primeira metade. O filme tenta ser subversivo ao matar dois personagens principais logo no começo, mas as mortes acabam perdendo o peso; aí é um problema conjunto de roteiro e direção, pois no papel é algo narrativamente muito interessante, e que acrescenta muito ao arco da Fênix. Mesmo assim, o Cíclope foi desde o começo um personagem pouco desenvolvido. Ele merecia mais, dado sua importância nos quadrinhos. Uma coisa boa pode ser dita: a trilha sonora é ótima, talvez uma das melhores da franquia. Temas como o da Fênix são extremamente poderosos musicalmente. No fim das contas, X-Men: O Confronto Final acaba sendo um filme de ação genérico com alguns momentos cringe, nem perto da sombra de seus antecessores; ainda que tenha um grande elenco e, de fato, alguns momentos incríveis, como a cena final de Wolverine e Jean. E independente de qualquer coisa, admito que gosto desse filme, por razões emocionais.
(Crédito: Divulgação - The Walt Disney Studios / 20th Century Studios)
Mesmo com um final amargo, a trilogia original dos X-Men ajudou muito a pavimentar o cenário dos filmes de super-heróis que viriam a seguir. Trouxe uma abordagem realista e que iria influenciar toda uma gama de produções, incluindo da rival DC Comics; filmes como X2 abriram caminho para a abordagem "adulta" da trilogia do Batman do Nolan por exemplo. Mas outra trilogia dos anos 2000 foi fundamental na consolidação do gênero: Homem-Aranha - mas isso fica para um outro momento.
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